
A divisão da direita é quase uma novidade nas
últimas décadas da história brasileira. “Quase” porque na era petista já
ocorreu uma divisão, pois grande parte da direita, a parte mais esperta, mais
raposa, e realmente ligada ao capital, apoiou os governos petistas por 14 anos.
Mas a divisão atual é mais grave, embora os atores
sejam os mesmos. Entre os líderes nacionais da direita, realmente ligados ao
capital, e uma grande parte dos eleitores de direita, que nem sabem o que é
capital, surgiu um abismo! Os partidos de direita, incluindo a extrema direita
que está tentando se passar por Centrão, assim como a grande imprensa, os
pensadores de direita, e o capital em si, estão declarando apoio ao ladrão de merenda.
O que o ladrão de merenda oferece é o que o capital mais deseja – estabilidade
financeira. O estrangeiro precisa transformar dólares em reais para explorar o
Brasil. Suponhamos que foram 100 mil dólares em 400 mil reais, e o lucro anual
10%, portanto 40 mil reais, somando 440 mil reais. Se o real se desvalorizar
10% no mesmo período (passando de 4 para 4,40 reais por dólar), os 440 mil
reais valerão os mesmos 100 mil dólares, ou seja, o lucro não vai existir para
o estrangeiro. Portanto, para os estrangeiros e seus sócios aqui dentro, o país
pode ter doenças do século XIX, pode ter os maiores índices de assassinatos do
mundo, pode ter estradas péssimas, pode se desindustrializar, pode estar com os
hospitais sem remédios e sem nada etc., pode afundar no mar, contanto que a moeda
fique estável. É exatamente o que tem sido feito por FHC, pelo PT, e agora por
Temer. Pobres dos colonos!
Contudo, grande parte do eleitorado de direita,
diante do medo da violência, do desemprego, e do fracasso do funcionamento de
tudo o que há no Brasil, maior colônia do mundo, não quer mais seguir a receita
de não-mudanças. Quem conversa com eleitores de Bolsonaro percebe que eles
podem ter ideias muito estúpidas (e realmente as têm) a respeito de quais
mudanças são necessárias, mas querem mudanças! O próprio Bolsonaro, pelo que
propõe, precisaria derrubar a Constituição de 1988 (que está com os pés na cova
de qualquer maneira). As propostas de Bolsonaro, como facilitar o acesso a
armas e as que derrubariam a Constituição são inaceitáveis para o capital! O
que gera Bolsonaro é o fracasso de um regime político. Nossa pseudo-democracia
é o governo dos ladrões para os ladrões. É governo de tudo que há de pior, o
governo de gente que só sabe roubar e se manter no poder, mas é incapaz de
terminar obras cuja complexidade é do século XIX, incapaz de construir redes de
esgoto, incapaz de evitar a volta do sarampo.
O ladrão de merenda precisa dos votos de Bolsonaro
para ter chance de chegar ao segundo turno. Mas apesar dele ter muito tempo de
TV e Bolsonaro não ter nenhum, apesar de ter apoio de uma vara de partidos,
dinheiro etc. terá enorme dificuldade para tomar os eleitores de Bolsonaro, e
até para ficar com eles se Bolsonaro não conseguir se candidatar. Isso porque
esses eleitores o conhecem, sabem que ele significa a manutenção do fracasso
como está (para o bem dos estrangeiros ricos, coisa da qual eles não sabem), e
querem mudança.
A esquerda ser dividida não surpreende ninguém, é
normal e saudável. Significa que está viva! Nem é possível que exista uma
esquerda verdadeira com ideias unificadas, porque seria anti-científico e
conservador. A divisão da esquerda nesse momento é também sintoma da crise
política, mas nesse caso é especificamente uma decorrência da crise do PT.
Abriu-se um vácuo, e ele está sendo ocupado por Ciro Gomes. Então iniciou-se
uma guerra de vida ou morte política entre o PT e Ciro Gomes. O PT, para
continuar imperando sobre a esquerda, para continuar sendo a opção do voto
útil, para continuar obrigando todo o eleitorado de esquerda a aceitar seus
candidatos como única opção contra a direita, precisa destruir a candidatura de
Ciro Gomes. Não é Ciro em si o problema, pois na verdade o PT faria guerra
contra qualquer um que ocupasse o vácuo petista. Ciro Gomes, para ser
presidente, precisa dos mesmos votos que o PT dominava por chantagem política. Inocente
de quem acha que pode existir conciliação. Se acontecer conciliação é porque um
lado já perdeu e se rendeu.
Contudo, a divisão na esquerda não parece que se
refletirá em divisão do eleitorado de esquerda. Existe quem diga que se Lula
não for candidato, não votará em ninguém, mas esses são militantes, são parte
da minoria de líderes, não refletem o eleitorado, que se guia pelo “voto útil”,
e votará em quem precisar votar para derrotar ou Bolsonaro ou o ladrão de merenda.
É uma briga entre líderes! É uma briga sobre qual o futuro da esquerda brasileira
– se a era petista continuará, ou se começará um novo tempo.
Retomando, a divisão da direita é completamente
diferente da divisão da esquerda. Na direita quase todos os chefes nacionais,
estaduais e até municipais estão de um lado só, do ladrão de merenda, mas
grande parte do eleitorado está com Bolsonaro. Na esquerda a divisão é entre os
chefes, e o eleitorado está esperando para ver qual restará para dar seu “voto
útil”. Óbvio que no segundo turno direita e esquerda tendem a apoiar qualquer
dos candidatos, respectivamente de direita e de esquerda, que precisarem
apoiar, mas isso será mais difícil à direita, onde muitos eleitores do ladrão de
merenda dificilmente votarão em Bolsonaro e vice-versa.
No caso da esquerda não são só as eleições que estão
em jogo, mas o futuro da esquerda brasileira! A força de Ciro Gomes é que ele
tem um projeto, o melhor que já foi apresentado ao Brasil nas últimas
décadas. A fraqueza do lado cirista é a
inorganicidade. Exatamente o oposto do Pt, que nunca teve projeto, nem
princípios, tanto que governou à direita por 14 anos, mas tem ainda alguma
organicidade. As diferenças entre Ciro e o PT são muitas, sendo que uma das
mais importantes é a questão nacional, pois o PT nunca foi nacionalista nem no
discurso, nem na prática, e Ciro está defendendo os interesses nacionais. Outra
enorme diferença é quanto às reformas políticas, assunto no qual o PT é conservador,
e Ciro tem propostas tão avançadas quanto o recall (revogação de mandato por
plebiscito).
A situação petista é deplorável. A perda de
influencia petista fica patente quando o PT não consegue mobilizar os eleitores
de Lula a favor de Lula. Dizem ser o maior partido da América Latina, mas no
mundo todo não existe partido que se mostre tão fraco para defender um líder
nacional preso. O PT já estaria acabado se não fossem 3 culpas da direita - O golpe de 2016, porque se Dilma ainda fosse a
presidente o PT seria nesse momento odiado por quase toda a população; A prisão
(política) de Lula, que o transforma em vítima; O governo Temer, que com seus
crimes contra o povo faz o governo petista parecer bom. – É difícil acreditar
que não foi de propósito por parte dos líderes nacionais da direita. Eles
precisam do PT como contraponto, e preferem o PT a uma esquerda de verdade.
Ciro aparece como grande beneficiário da situação,
porque sem Lula o PT não está atingindo 2% das intenções de voto (está sendo
superado pelo PCdoB), e a direita não parece que se unirá completamente para o
segundo turno. Ciro precisa tomar cuidado com sua segurança pessoal, uma vez
que as forças que dominam o Brasil são sujas até a medula, e capazes de tudo
para manter seus roubos, ou seja, manter o Brasil como colônia.
Porém, como o Brasil não é para principiantes,
existe uma saída muito mais brasileira para o capital, que é fazer logo a
anistia que os políticos ladrões todos querem, soltando Lula para que este tire
Ciro do jogo. Lula é de confiança do capital estrangeiro, manteve a política
econômica de FHC, permitiu a desindustrialização do país, levou os lucros dos
bancos aos maiores patamares de sua história.
Infelizmente, Lula conseguiria abafar por algum
tempo a crise política, pois continuaria dando lucros ao capital ao mesmo tempo
que teria otários que o defenderiam à esquerda. Mas abafar definitivamente a
crise atual é impossível! O fato de que grande parte da direita tenha
abandonado as posições de não-mudança é mais uma prova disso. O surgimento à
esquerda de um programa de desenvolvimento nacional é outro sintoma de início
de outra era. A crise política não é fruto das denúncias de corrupção, mas da
realidade em que o regime político vigente é um completo fracasso.
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