Os estudantes ocuparam a Reitoria da UFSJ na manhã desse dia
24 de Outubro de 2016. Essa ocupação não tem motivos locais, mas é a
contribuição dos universitários da UFSJ à onda de ocupações que atinge todo o
país. A bandeira principal é contra a PEC 241, uma falsa polêmica, mas isso não
diminui em nada a importância das ocupações.
Os comunistas devem apoiar de todas as maneiras possíveis
esta e todas as ocupações que os estudantes têm feito! Ocupações são
pedagógicas, politizam os estudantes que delas participam, e ensinam muito mais
do que meses de algumas aulas. Ademais, embora em torno de uma falsa polêmica,
as forças políticas estão em choque, com princípios opostos (polêmica essa bem
real), e o resultado dessa luta será real, apesar da polêmica ser irreal. A
humanidade sempre lutou em torno de fantasmas, falsas polêmicas, porque só
muito recentemente, e só os que mais entendem o marxismo, conseguiram começar a
entender racionalmente a história humana, mas essas lutas moveram a história
humana mesmo assim! Pois apesar de lutarem em torno de quimeras, as bases
sociais que lutam são bem concretas. Lembremo-nos de que desde 2013 a divisão
social/ideológica se acentuou no Brasil.
Quem não quiser debater detalhes sobre a PEC pode pular para
o item 2, onde vou debater a polêmica real, que é contra uma visão de economia
do século XIX, o monetarismo. E quem não gosta de economia pode pular para o
item 3, onde proponho o fim de 40 anos de defensiva por parte das “esquerdas”
brasileiras.
1 – PEC – Propostas de Emenda Constitucional ou Promessa de
Economia Colonial
1.a. – Quem acredita no governo?
O primeiro ponto estarrecedor quando observamos o debate em
torno de PCE 241 é que os dois lados acreditam no governo!!! Que mundo é esse?
De fato, tanto os que chamam de ”PEC salvadora” quando os que chamam de “PEC do
fim do mundo” estão acreditando que ela é implementável, e que é o que diz no
cabeçalho da lei, pois uma simples corrida de olhos nos detalhes faz rir e descobrir
que o cabeçalho é uma mentira.
O governo está prometendo conter gastos. Trata-se da mais
velha promessa governista desde que existem debates orçamentários, no mundo
todo, ou seja, desde que o Parlamento inglês tomou para si a aprovação do que
eles chamavam de gadget. O Brasil mesmo promete isso desde sua independência.
Quando esse tipo de promessa era dirigido ao FMI chamava-se Carta de Intenções.
Como era correto que se fizesse, a esquerda gritava, mas fato é que nenhuma
Carta de Intenções nunca foi cumprida, assim como em 200 anos de história o
Brasil nunca conteve gastos tanto quanto os governantes haviam prometido. Para tentar
fazer a mentira mais forte esse governo irresponsável deu à promessa o nome de
Emenda Constitucional, o que apavorou muito alguns panacas, como se a
Constituição de 1988 já tivesse valido alguma coisa, ou como se ela ainda fosse
durar muito.
Então, para nossa diversão, o mercado financeiro, para quem a promessa foi feita, obviamente não acreditou (não acreditaria nem se a promessa fosse conter gastos só até 2018, quanto mais para depois dessa data, quando o governo será outro), mas a oposição acreditou!
1.b. – O que realmente diz a PEC 241
Suponhamos, porém, que a PEC será cumprida, o que é
impossível, mas acreditemos só para observarmos seus detalhes.
Primeiro, ela não congela valores nominais como muita gente
tem divulgado. Ela prevê a correção inflacionária todo ano. Sendo assim ela
garante em alguns casos mais do que existe hoje! É uma promessa de fazer o
mesmo que já é feito.
Segundo, o artigo 102, que algumas pessoas leram rapidamente
(porcamente) e concluíram que proíbe contratações etc., na verdade é um furo no
congelamento, que deixa claro que se pode, sim, ultrapassar mesmo a meta
corrigida pelas inflações, pois contratações e aumentos só serão (seriam)
proibidos em caso de desrespeito dessa meta no ano anterior!!! Ou seja, a
própria lei diz – serei descumprida!
1.c. – O regime de 1988 não tem mais 20 anos de duração
Só os cegos ainda não querem aceitar que o regime de 1988
está condenado. Eis uma característica interessante de nosso país – os regimes
caem quase sozinhos. Nada mais funciona. Nada mais tem moral e respeito
público. O governo Temer é fraco, e recua diante da mais mínima gritaria. O
Congresso Nacional e o Judiciário estão tão ou mais desmoralizados. As Forças Armadas,
a imprensa, as religiões, nada mais tem credibilidade. Sintomas normais. Cresce
a participação política, e governar é cada dia mais difícil, tornando-se mesmo
impossível.
Que sentido tem então ter medo de um congelamento de 20
anos? E como se poderia congelar os gastos mesmo até 2018, se será necessário
ao mesmo tempo liberar recursos para acalmar a população e para a reprimir???
1.d. – Uma esquerda sem direção
A internet mais uma vez nos permitiu ver detalhes das
coisas, e daí aperfeiçoar nossas conclusões. Já percebíamos que toda a “esquerda”
brasileira, mesmo se excluirmos a bandidagem petista, está sem direção real, ou
que essas direções são incapazes. O caso da PEC 241 mostrou os detalhes da
coisa. Foram militantes que leram a PEC porcamente e que em alguns casos
também não entendem nada de economia que começaram a gritaria, e os “dirigentes”,
de todas as forças, de todos os partidos, obedeceram a esses militantes!?!? Não
temos direção! O senso comum tomou o controle da maioria dos partidos que se
dizem de esquerda. Ser direção não é ter um posto de direção, mas isso é só o
que temos.
2 – A polêmica real contra os liberais/monetaristas
A PEC 241 foi só uma declaração de princípios! Mas isso não
é tão pouco. Essa luta, sim, é verdadeira, e lutá-la é importante para a
educação das massas, que tendem a aceitar o monetarismo por ser de acordo com o
senso comum. Grande parte dos militantes “de esquerda” são monetaristas sem o
saber. Trata-se daquela baboseira que nos ensinam no ensino médio, que não se
pode emitir muita moeda pois isso geraria inflação e outros problemas, e
portanto seria necessário conter gastos.
Basta lembrar que sempre que se quer defender a contenção de gastos se faz a comparação idiota entre um país e uma família, ou pior ainda, entre um país e uma empresa. Quem faz essa comparação podia acrescentar, “eu não sei o que é dinheiro”. Não é vergonha. Quase ninguém sabe! Um país emite moeda, as famílias, não. Isso muda tudo!
Quando dinheiro era de ouro e prata os monetaristas já
estavam errados, mas ao menos existiam limites reais para a emissão de
dinheiro. Os governos não podiam emitir tanta moeda quanto necessário, ou não
podiam limitar a emissão, pois existia um limite material que não impedia mas
dificultava a ação financeira dos governos. O Barão de Mauá, porém, já entendia
que o monetarismo é uma autolimitação, uma burrice.
Quando, em 1944, os acordos de Breton Woods tiraram o ouro
de circulação, e principalmente a partir de 1973, quando o dólar rompeu sua
paridade com o ouro, desfazendo-se de vez do lastro, a crendice monetarista
acabou de perder o sentido. Segundo a teoria o lastro atual das moedas é a economia
de cada país, mas isso é uma verdade teórica, que não prescinde da verdade
prática – é o poder político o verdadeiro lastro, é a lei que diz que todo
mundo tem que aceitar a moeda emitida pelo poder. Claro que a verdade teórica
continua sendo verdade, ou seja, se um país emitir moeda de forma extremamente
irresponsável aquilo que nossos professores de ensino médio ensinaram de forma
simplória (por isso errada) se torna verdade, e os preços sobem. Contudo, o
poder dos governos de manipular a moeda cresceu muito, e pode-se emitir muita
moeda (como de fato se emite) sem gerar inflação.
2.a – A economia real e o dinheiro
O dinheiro existe, e é importante, só não é tudo o que
imaginam os monetaristas. Pensemos em dois extremos irreais. Se não tivermos
roupas para 200 milhões de brasileiros, podemos emitir quantos reais quisermos,
e continuaremos sem roupas. Por outro lado, se tivermos roupas, mesmo que todo
o dinheiro entre em combustão espontânea continuaremos tendo roupas. A falta do
dinheiro, porém, tornaria as trocas impossivelmente difíceis, e a distribuição
das roupas daria um trabalho imenso, que hoje é feito pelo mercado.
Contudo, o que faz as roupas não é dinheiro, é mão-de-obra,
matéria prima e energia. Dinheiro também não é capital de verdade. Capital é
mão-de-obra, matérias primas e energia já processados de forma a serem
reutilizados para produzir mais. Portanto, se um país tem, como o Brasil, muita
matéria prima, muita mão-de-obra, e muita energia, os limites financeiros são
fictícios.
Temos, sim, limites reais. Primeiro, em divisas. Divisas não têm nada a ver com o dinheiro que circula internamente. São nossas reservas internacionais, ou seja, moedas estrangeiras e ouro. Obviamente o resto do mundo não nos dará nada de graça, então o que temos que importar, sejam matérias primas ou tecnologia, é uma limitação real. Emitir mais ou menos Reais não tem nada a ver com isso (diretamente).
O outro limite real é a tecnologia, incluindo a formação de
nossos trabalhadores. Isso só se resolve com espionagem, portanto nem é um
problema para se resolver na área econômica.
Mas o limite real que de fato tem sido nosso gargalo, que os
políticos não confessam pois seria confessar incompetência, fracasso, e mesmo
que suas idéias são erradas, é a falta de infraestrutura. Infraestrutura para
um país é Capital! Hidroelétricas ou outras usinas fornecedoras de energia,
ferrovias, estradas, portos, coisas que não se constrói em poucos meses.
Lembremo-nos que se Dilma não tivesse adotado a partir de
2011 medidas que criaram a crise econômica brasileira (que não é a internacional)
o país teria tido apagões, assim como o porto de Santos já estava com dias de
engarrafamento. Entre confessar que o modelo liberal não dá certo ou jogar o
país em uma recessão, nossos políticos preferiram a recessão! Tanta
infraestrutura quanta precisamos tem que ser construída pelo Estado, com
empresas estatais. Eis o que nossa casta de políticos ladrões não aceita!
2.b – O exemplo dos EUA
Mas suponhamos que você não entenda, que continue preso ao
raciocínio de seu professor do ensino médio. Observe então os exemplos reais.
Primeiro, os países mais ricos do mundo são os mais endividados,
isso em relação aos seus PIBs, assim como suas famílias são mais endividadas,
também em relação ao que ganham. Essas dívidas não são um momento de crise,
elas já existem há décadas, são feitas para existirem para sempre. São de fato
uma maneira de transferir impostos para o mercado financeiro. Esses países
continuam sendo os mais ricos, e crescendo etc. Ou seja, somos contra esse
roubo, mas temos que confessar que ele não é o perigo que os monetaristas imaginam.
Segundo, quando
explodiu a Segunda Guerra Mundial os EUA estavam em recessão profunda,
quebrados, endividados. Os monetaristas aconselhavam Roosevelt a economizar,
para manter o equilíbrio das contas. Mas para sorte dos EUA Roosevelt fez o
contrário – gastou o que não tinha! Encomendou de tudo! Mandou produzir muito
tudo, armas de todos os tipos, aviões, navios, submarinos etc. Para isso emitiu
moeda o tanto que foi necessário. Resultado – ao final da guerra os EUA eram a maior
economia do mundo, produzindo praticamente metade de tudo o que o mundo
produzia.
Tivesse se apegado à crença no dinheiro, Roosevelt teria no
mínimo perdido o Pacífico para o Japão, e nunca mais teria se recuperado.
Por que Roosevelt não gerou uma enorme inflação nos EUA? Porque
a produção cresceu tão rápido, ou mais, que a emissão de moeda! A questão não é
emitir ou não moeda, é se com essa moeda se estimula ou não a produção.
2.c – Os patrões do Brasil e a estabilidade do câmbio
Não são os políticos ladrões sozinhos que mandam no Brasil. Metade do orçamento da União vai para o mercado financeiro, por conta de supostas dívidas (que não têm nada a ver com o endividamento real do país), portanto sabemos que os capitalistas financeiros são os patrões de fato desses políticos ladrões e dominam nosso país.
Não são os políticos ladrões sozinhos que mandam no Brasil. Metade do orçamento da União vai para o mercado financeiro, por conta de supostas dívidas (que não têm nada a ver com o endividamento real do país), portanto sabemos que os capitalistas financeiros são os patrões de fato desses políticos ladrões e dominam nosso país.
Para o capital estrangeiro a estabilidade da moeda é uma
necessidade absoluta! Se a inflação é ruim para os trabalhadores, para os
capitalistas que precisam trocar dólares por reais e depois reais por dólares é
muito pior. Suponhamos um lucro de 10% ao ano, que é a média atual brasileira.
O estrangeiro colocou no Brasil 100 dólares, trocando-os suponhamos por 200
reais, teve um lucro de 10%, ou seja, 20 reais. Se o dólar subiu 100% nesse
ano, 200 reais viraram 50 dólares e o lucro virou 5 dólares. Ou seja, o prejuízo
do capitalismo estrangeiro seria de 45 dólares apesar da empresa em que ele
investiu ter lucrado 10%.
É para agradar esses caras, seus patrões, que os Temer e
Mantegas prometem conter gastos, daí não emitir moeda, daí não gerar nem um
tiquinho de inflação.
2.d. – O endividamento do país e as contas da União
Algumas pessoas estão confundindo duas coisas muito
diferentes. Primeiro é o que o país deve em relação ao seu PIB, ou seja, em
relação ao que produz por ano. Nesse caso o Brasil é pouco endividado, e os
países mais endividados do mundo são o Japão e os EUA. Outra coisa é quanto um
país tira de seu orçamento anual (do governo) para pagar dívidas. Ai o Brasil
parece muito endividado, pois paga metade do que tem de orçamento.
Pode parecer que as duas coisas são ligadas, mas de fato,
não. Nem sequer são os mesmos devedores, pois o Brasil não se limita à União (também
não são os mesmo credores). O que nos
faz perder metade do orçamento da União é política! Os capitalistas têm o
controle do país e daí se pagam com juros estratosféricos e criam leis pelas
quais se pagarem é mais importante que qualquer outra coisa. De fato podíamos resolver
essa dívida da União com decretos simples, seja limitando a porcentagem do
orçamento que pode ser gasto com dívidas, seja fazendo uma auditoria, seja
abaixando os juros. Não se trata de um problema cujas raízes e soluções sejam
econômicos.
2.e – Da falsa polêmica à verdadeira
Para combater a PEC os militantes precisam combater a lógica
monetarista. Portanto precisam estudar, precisam desenvolver seus conhecimentos
de economia, exatamente em um aspecto em que nossa “esquerda” é muito fraca, e
tem até mesmo reproduzido (ainda mais no governo petista) os discursos e
práticas da direita.
É uma das coisas para as quais os comunistas devem
aproveitar a conjuntura – destruir a crendice monetarista ao menos entre os
militantes.
3 – Sair da defensiva
A vantagem de uma bandeira defensiva é que pode ampliar. Por
exemplo, o reitor é tão interessado em que os gastos não sejam congelados
quanto os alunos, portanto ele só ficará contra os estudantes se for muito
burro.
A desvantagem é que não se conquista terreno com defensivas.
Suponhamos que o governo Temer recue mais uma vez diante da gritaria. Em que
teríamos avançado? Simplesmente ficaríamos na mesma. Seria uma vitória
interessante, teríamos derrotado o senso comum monetarista dominante, mas só
isso, e daí a dias estaríamos em outra luta defensiva.
Compara-se muito a política com a guerra, mas também é
interessante a comparação com o futebol. Quando um time, sem necessidade, se
coloca na defensiva, anima os adversários à ofensiva.
Há mais de 30 anos a “esquerda” “brasileira” está na
defensiva. Antes da queda da URSS a desculpa era que os militares poderiam
voltar ao poder. Quando a URSS caiu virou a desculpa principal. Mentiras! Se já
na década de 90 forças revolucionárias avançaram em diversos países, inclusive
em países menores, porque em um gigante como o Brasil seríamos obrigados à
defensiva?
3.a. – Não afundar junto com o regime de 1988
O regime de 1988, como já se disse acima, está condenado.
Desde 2013 isso ficou claro. Agora todo mundo tem que optar – vai defender esse
regime e cair junto com ele, ou vai bater nele para ter influencia no próximo? Os
de cima do muro estão com o regime.
Os petistas, sempre atrasados, levantaram uma bandeira
mentirosa e conservadora ao defenderem o regime atual como se ele fosse uma
democracia. Esse discurso é antidemocrático, criminoso portanto. Se democracia
fosse isso, por que o povo a defenderia? É jogar água no moinho das forças
antidemocráticas.
A única maneira de defender a democracia é separá-la desse
regime. Condenar esse regime como antidemocrático é que é defender a
democracia, e abrir a possibilidade para que a Sétima República venha a ser
democrática de fato.
3.b. – Traçar nos corações da juventude as características
da Sétima República
Não se pode inventar uma nova democracia no papel. A nova
democracia tem que ser praticada, para que as pessoas acreditem nela! As
ocupações têm esse papel de experiências ultra-democráticas. Nos Sindicatos, nos DCEs, onde temos força,
temos que jogar fora a pseudo-democracia das eleições diretas, burguesas, e
criarmos democracias diretas, participativas, sem dinheiro.
Ao mesmo tempo, o debate sobre o Estado e a democracia
tornaram-se centrais. Os debates econômicos são importantes, mas quando um
regime político está prestes a cair, debater sua política econômica perde uma
parte de seu sentido. É hora de debater detalhes do designer político, e
defendermos os que forem necessários como princípios para a Sétima República.
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