
O Papa
disse que o comunismo tenta roubar da igreja a “bandeira dos pobres”, e que
como o cristianismo tem quase dois mil anos a mais que o marxismo, então os
marxistas são cristãos. Essas declarações foram em resposta a declarações ainda
mais absurdas, de que o Papa seria leninista porque critica o capitalismo. O
Papa ao menos deu provas de entender o que é o cristianismo, coisa que não se
pode dizer nem de um por cento dos “cristãos” atuais, que são anti-cristãos em
praticamente tudo o que pensam e fazem, mas o animal que chamou o Papa de
leninista não entende nem o cristianismo, muito menos o marxismo, e portanto
não conseguir entender um só parágrafo de Lênin.
Em primeiro
lugar, o marxismo não tem nada a ver com pobres e com pobreza, não é
igualitarista, nem distributivista, mas o cristianismo era. As piadas que os
capitalistas fazem sobre os comunistas na verdade se aplicariam aos verdadeiros
cristãos, mas para isso teriam que ser um pouco mais extremistas. Vamos ao
exemplo da clássica piada dos tênis, em que um jovem vai se filiar ao Partido
Comunista. Então o secretário do Partido pergunta: “Se você tivesse duas casas, daria uma ao Partido?” É uma piada que
demonstra completa ignorância sobre o marxismo, confundindo o marxismo com
distributivismo e igualitarismo, mas poderia se aplicar ao cristianismo,
contanto que fosse formulada assim: “Se
você tivesse UMA casa, a VENDERIA e doaria TODO o dinheiro à comunidade cristã?”
O cristianismo do século I era assim, igualitarista e distributivista até o
último centavo. Já o comunismo de Marx e Engels sequer veta a filiação de ricos
ao Partido. O próprio Engels era rico e assim ficou até morrer, no comando do
movimento marxista mundial. Marx também não nasceu pobre. Fidel e Raul Castro
eram mais que ricos, latifundiários. Mao Zedung e Lênin não eram ricos, nem
pobres. Astrogildo Pereira, fundador do PCB, era de uma família dominante em
uma pequena cidade da roça.
O movimento
cristão não só defendia os pobres, mas idolatrava a pobreza, obrigando seus
membros a se reduzirem à pobreza. Já no marxismo o único papel que se reconhece
da pobreza é como um dos pilares de sustentação do capitalismo, e mesmo uma das
raízes sem a qual o capitalismo sequer poderia ter nascido. A revolução
industrial só foi possível na medida em que existiam milhões de pessoas na
miséria e portanto dispostas a trabalharem por salários de fome, e até hoje o
capitalismo precisa da pobreza para ter trabalhadores e salários baixos.
O marxismo
não é um movimento “dos pobres”, nem tenta ser. O Partido Comunista quer
crescer entre todas as classes sociais, e prioriza a classe que considera mais
capaz, que é o proletariado, com destaque para seus setores operários. Não é
preciso ser muito informado para saber que os operários estão longe de serem os
mais pobres em nossa sociedade. A decisão de Marx, de apoiar o proletariado, se
baseia no estudo da história humana nos últimos milhares de anos, quando as
forças principais que geram grandes transformações são as classes sociais.
Portanto, a única forma possível de intervir conscientemente na história humana
seria apoiando e fortalecendo determinadas classes sociais. Seria necessário
apoiar uma classe, em primeiro lugar, capaz de tomar o poder, mas ao mesmo
tempo, cujos interesses materiais coincidam com o fim das classes sociais. O
proletariado já demonstrou, desde a época de Marx, sua capacidade de chegar ao
poder, e como classe produtora de todas as riquezas, só pode ter o interesse econômico
de abolir as classes sociais.
Marx não
tentou prever o que seria a sociedade sob domínio dos operários, e nem
interessa, e aliás é certo que o poder operário pode assumir uma infinidade de
formas e pode adotar uma infinidade de políticas completamente diferentes entre
si e até opostas. Talvez em algum país operários sob influência cristã sejam
igualitaristas e distributivistas, mas é fácil imaginar que quase sempre
adotarão um critério nada igualitarista, aliás defendido por Marx como o mais
eficiente quando o capitalismo tiver caído a pouco, que é “a cada um segundo o
seu trabalho”.
Provavelmente
o Papa Francisco leu o Manifesto Comunista, mas por algum motivo desconsiderou
a parte em que Marx e Engels traçam as diferenças gigantescas entre o cristianismo
igualitarista dos primeiros e verdadeiros cristãos e o comunismo do Manifesto.
O engano do Papa é aliás, comum, praticamente generalizado. As pessoas afirmam
que Cristo era comunista acreditando que o era como Marx, e também acreditam
que Marx era igualitarista e distributivista como Cristo. Não é simples
desinformação, porque de fato pode-se explicar a um capitalista vinte vezes que
as coisas não são assim, mas ele “esquecerá”, esquecerá que Cristo era
igualitarista e distributivista para assim poder continuar se dizendo
“cristão”, e esquecerá que o marxismo é completamente diferente do cristianismo
e voltará a criticar “o comunismo” como se esse fosse o cristianismo. O
conhecimento de cada ser humano parece estar limitado involuntariamente, como
podem perceber os professores (caso do autor desse texto). Os capitalistas
revelam-se de inacreditável incapacidade para compreenderem o marxismo. Têm uma
resistência doentia a estudar qualquer obra que saibam ser marxista, e quando
estudam esquecem as partes que lhes são muito desagradáveis. Dando aulas de
história nota-se que alguns conteúdos, embora simples, enfrentam resistência de
aprendizagem, sendo repetidamente esquecidos. Por exemplo, não é complicada a
informação de que todo Estado que já existiu era ou é na realidade uma ditadura
de classe, mas os estudantes resistem a aceitá-la.
Já o desinformado que disse que o Papa é leninista conseguiu revelar uma ignorância
assustadora nessa declaração. Primeiro, ele revelou que desconhece que já
existiam críticas ao capitalismo antes mesmo de Marx nascer, inclusive vindas
de setores cristãos. Para esse exemplar do “pensamento” capitalista atual, toda
a crítica ao capitalismo é marxista!?!? Obviamente, um gênio desses não podia
nem imaginar o que é o leninismo. Ele deve pensar que o leninismo são críticas
ao capitalismo, como aliás acreditam os capitalistas em massa. Noventa por
cento do leninismo é o estudo sobre como se faz uma revolução proletária, ou
seja, algo do qual o Papa Francisco passou longe.
Voltando às
declarações do Papa, deixemos claras algumas coisas. Nós comunistas (marxistas)
respeitamos o movimento cristão verdadeiro dos séculos I e II como exemplares
antigos de luta por justiça, talvez até como ancestrais distantes do marxismo. O
Manifesto Comunista trata do
comunismo cristão lado a lado com os socialismos utópicos. Esse movimento,
porém, morreu, acabou e fracassou, porque não tinha mesmo nenhuma possibilidade
de sucesso. O igualitarismo, aliás, não é justo, e o distributivismo também
não, assim como não são eficientes nem para a economia, nem como movimento
político. Os próprios cristãos só tinham essas práticas porque aguardavam o
apocalipse para breve, de forma que não tinham preocupações econômicas e
políticas.
O que
existe hoje, o catolicismo tanto quanto as igrejas protestantes, longe de serem
cristãos, carregam a moral romana e judaica. Praticamente tudo o que a igreja
católica manteve de Cristo é o que este herdou do judaísmo. As inovações
propriamente cristãs foram descartadas. Publicamos um artigo sobre isso há
alguns anos, chamado O Cristianismo, o catolicismo e o comunismo, aqui mesmo no
São João del Pueblo.
O movimento
comunista não é cristão porque é a superação do cristianismo assim como de
todas as utopias. O movimento comunista nasce também do fracasso do
cristianismo e outros socialismo utópicos. Depois de dois mil anos, tempo que bem
ressaltou o Papa, de fracasso das diversas táticas cristãs, desde a original,
passando pela caridade, pelo movimento monástico, por revoluções de inspiração
religiosa, enfim, dentro do próprio mundo cristão, compreendeu-se que não se
pode esperar um mundo melhor das boas intenções, da consciência, do amor etc.,
mas sim que se deve arrancar um mundo melhor de humanos imperfeitos, mal
intencionados, inconscientes e odiosos, usando a ciência!
É por isso
que o marxismo nunca foi igualitarista, nunca inventou regras para uma
sociedade perfeita, nunca impôs limites de propriedade, não cultua a pobreza,
nem condena os ricos. Por uma perspectiva científica nada disso faria sentido.
O poder humano de transformação da natureza se baseia em seu conhecimento sobre
ela, e não em sua vontade, ou seja, não é contrariando o conhecimento sobre a
natureza que se transforma essa natureza. Assim também, a vontade dos pensadores
que inventaram utopias não vale nada se contrariar as forças que realmente
movem as sociedades.
Os estudos
marxistas indicam que a forma de acabar com a pobreza não é a distribuição de
bens, que sequer é possível. A forma de acabar com a pobreza é o
desenvolvimento tecnológico extremo, mais exatamente, o crescimento das forças
produtivas em um patamar que ainda não podemos imaginar. A distribuição já está
determinada quando se realiza a produção, pois então já se define se as
matérias primas, a energia e a mão-de-obra disponíveis serão gastos com bens de
luxo ou com bens de consumo populares. O marxismo aplaude cada passo no desenvolvimento tecnológico, elogia o capitalismo como um modo de produção no qual as forças produtivas avançam mais rápido do que avançavam em antigos modos de produção, mas denuncia que o capitalismo dificulta e as vezes trava esse desenvolvimento, que poderia ser muitas vezes mais rápido sob domínio proletário.
Mais informações em: O Cristianismo Primitivo, com textos de Engels e Rosa Luxemburg.
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