Do transporte público coletivo de São João del Rei às alianças de classes



Em artigo recente no São João del Pueblo, o camarada Alexandre Marciano foi muito claro a respeito da situação do transporte coletivo em São João del Rei depois da vitória dos manifestantes que acamparam em frente à prefeitura. Na onda das manifestações que tomaram o país, os movimentos socais de São João del-Rei, com destaque para os estudantes, conseguiram convocar uma gigantesca manifestação, a maior da história da cidade. Em decorrência o prefeito abaixou a passagem de ônibus em 15 centavos. A segunda manifestação não foi tão expressiva, mas mais determinada, decidiu se transformar em um acampamento em frente à prefeitura. O prefeito então recuou mais uma vez e cancelou a fraudulenta licitação da empresa Presidente, do mesmo dono da Gol, o que aliás já era uma antiga decisão judicial. Agora, para que realmente essas vitórias resultem em melhorias, é necessário conseguir influenciar nas decisões sobre o que será do transporte público municipal.

O perigo todos conhecem, é uma Presidente ser substituída por outra, ou seja, não mudar nada. Isso pode ser feito com ou sem empresa pública. Em Belo Horizonte existe a BH Trans, que nominalmente é a empresa pública que dirige o transporte coletivo, mas na prática a BH Trans não tem nenhum ônibus e todas as linhas estão nas mãos das grandes empresas, como a Presidente. Aliás, é muito provável que vários ônibus que hoje circulam aqui tenham circulado em BH e outras grandes cidades grandes por vários anos. Os motoristas e cobradores também não são pagos pela BH Trans, mas pelas empresas que são concessionárias das linhas.



A bandeira normal dos socialistas para o transporte público seria a completa estatização e a completa gratuidade. Não devemos perder o último desses objetivos de vista. Contudo, nossa experiência no século XX, tanto em revoluções socialistas quanto no Brasil, indica a possibilidade de outro caminho quanto à organização desse setor da economia. As empresas estatais e mesmo autarquias brasileiras são empresas nas mãos dos políticos de plantão, e se for criada uma SJ Trans, sob gestão petista, não será diferente. Quanto maior for essa empresa, maior será o poder e o enriquecimento dos cabos eleitorais e parentes que forem indicados para sua direção. Dados os exemplos dados por esse mesmo tipo de gente governando outras cidades, estados e a União, eles simplesmente contratarão uma empresa particular para terceirizar todo o serviço da empresa pública, de forma a ganharem dinheiro gordo e com o mínimo de esforços.

Os manifestantes sozinhos, mesmo que consigam mobilizar tantas pessoas quanto na manifestação gigantesca de Junho, não têm forças para impor à prefeitura uma empresa pública organizada da forma ideal, nem têm unidade sobre o que seria esse ideal, e não há tempo para forjar tal unidade. Existem, porém, duas outras forças que se forem envolvidas no processo terão grande influencia sobre a opinião pública, e se conseguirem se unir essas duas outras forças aos manifestantes, então poderemos ter resultados positivos.

Existem em São João del Rei diversos donos de vãs e ônibus, empresas, cooperativas etc. Se essas empresas pudessem pegar as linhas, seria ótimo para toda a economia, pois o grosso do dinheiro ficaria aqui, enquanto hoje vai para as mãos do dono da Gol, que não deve morar nem no Brasil. Elas poderiam pegar as linhas, se a licitação fosse por linha, e se uma mesma empresa só pudesse pegar uma segunda linha depois de todos os concorrentes aptos terem pego uma. A prefeitura alega que se fosse assim nenhuma empresa de fora viria concorrer. Ora, é isso mesmo o que queremos!

Para ganhar a opinião pública, e daí as linhas, os donos de vãs teriam que ir para as ruas. Teriam que rodar a cidade, aproveitando o clima de manifestações, fazendo um buzinaço e defendendo claramente suas posições. Teriam que apelar para o sentimento bairrista com os cartazes "Não precisamos de empresa de fora" e "Podemos oferecer transporte coletivo para a cidade". Teriam que apelar para a economia dizendo "O dinheiro ficará na cidade". Teriam que explicar a forma, "licitação por linhas". E para vencerem completamente, ganhando de vez a opinião pública teriam que fazer uma aliança, "Garantimos os empregos dos trabalhadores da Presidente". Teriam dinheiro e vagas suficientes para isso.

A soma de forças da pressão entre os manifestantes, a justiça da manutenção dos empregos dos trabalhadores da empresa Presidente e a pressão dos motoristas das vãs levariam à vitória. A simples manifestação das vãs, ao dizer garantir os empregos, os garantiria de fato, pois se isso fosse oferecido por simples cidadãos, como poderia ser negado pelos políticos? Sim, de fato, trata-se de uma aliança de classes, entre proletários e pequenos-burgueses, intermediada pela intelectualidade. Algumas pessoas, mesmo pseudocomunistas, acham que comunistas são avessos a alianças de classes. Se fosse assim, teriam que mudar de símbolo, pois o símbolo comunista é o símbolo de uma aliança de classes, o martelo dos proletários e o cutelo dos camponeses. No Brasil, contudo, onde os camponeses não chegam a 3% da população, onde buscaremos aliados? A que corresponde o cutelo (a foice) de nosso símbolo no Brasil? Acredita alguém na possibilidade do proletariado fazer uma revolução sem ter aliados? Na década de 20, um camarada brasileiro, Basbawn eu acho, levantou a tese de que no Brasil o proletariado precisaria buscar aliança com setores da pequena-burguesia. Ele foi na época contrariado por camaradas europeus, que estavam apegados ao caso russo como se fosse um modelo, mas é hora de retomar esses estudos, pois pode ser que ele estivesse certo.

Comentários

AF Sturt Silva disse…
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AF Sturt Silva disse…
Mas essa frota que tem na cidade daria conta do transporte? E ônibus, eles têm? Outro elemento seria o problema dos carros na cidade. Um coletivo carrega muito mais gente do que uma kombi, por exemplo.
A frota local conta também com ônibus. Aliás, inclusive os ônibus exigidos pelos manifestantes que hoje mesmo estão trancando uma estrada em São Sebastião da Vitória. São diversos autônomos, pequenos empresários e cooperativas. Mas deve-se levar em conta também que São João del Rei é uma cidade histórica, com ruas onde não deviam passar carros grandes, e as grandes empresas resistem em colocar vãs e microônibus nas linhas que passam nessas ruas.