A aproximação de um tsunami econômico e a grande encruzilhada do governo Dilma - um ensaio

Exatamente quando o governo Dilma está com elevadíssima popularidade é que é a hora de lembrar que o Partido Comunista Brasileiro (PCB) não faz parte desse governo, para depois não dizerem que pulamos do barco afundando. Também é necessário lembrar disso quando temos que fazer alguns julgamentos positivos sobre Dilma e algumas medidas. Acontece que o momento é especial, o preço do aço, como há algumas semanas já publicamos a respeito da Vale, está mesmo em queda, a China está reduzindo sua produção e a Usiminas informou que está cancelando o planejado crescimento da extração de ferro. Em economês que funciona (não a bobajada da TV) isso significa agravamento da crise de super-produção, e agora (Vale e Usiminas) atingindo o Brasil. Não é, de forma alguma, motivo para comemorações, nem desânimo, nem pânico. É motivo para apontarmos soluções socialistas.



O fato da produção chinesa estar em queda é o que destrói a blindagem brasileira. É o Partido Comunista Chinês que resolveu tentar construir uma aliança estratégica com o Brasil, o que vem fazendo desde a ditadura militar com todos os governos, mas o fez especialmente com o governo Lula. A decisão de importar não está nas mãos dos consumidores chineses, pois o PCC mantém a moeda chinesa sempre superdesvalorizada exatamente para desestimular importações. Portanto a decisão de importar do Brasil, que tem feito parecer aos brasileiros que a crise não existe, é do governo chinês. Embora as crises de superprodução sejam cíclicas, elas têm história, não caem do céu, e na última década a superprodução que atingiu o mundo se chama China. O mundo capitalista tanto fez para evitar que a China caminhasse para o socialismo que o Partido Comunista Chinês entendeu, na década de 70, que só conseguiria, a partir das condições que tinha na China e tendo rompido com a União Soviética até quase uma guerra, construir o capitalismo, não ainda o socialismo. Construíram então um capitalismo de estado, em que o mercado não domina a política, nem as próprias regras econômicas, mas no qual existe mais livre iniciativa, mais lucro, mais estabilidade que no capitalismo brasileiro. Os capitalistas agora não podem fechar as portas para China, que na verdade já controla várias portas... Perderam muito mercado, perderam muitas indústrias, fontes de matérias primas (caso das brasileiras), postos de trabalho, e eis a crise de superprodução. Nós também perdemos postos de trabalho por culpa das porcarias chinesas, podem nos responder. Mas isso o mundo todo sofreu, mas poucos países têm a compensação de também venderem muito para a China.

Porém, esse quadro, como qualquer quadro, não pode se perpetuar. A própria China já está perdendo os mercados que ela mesma ajudou a destruir. Mas o mais importante é que dentro da China também a situação não pode se perpetuar. O capitalismo chinês, embora controlado por punhos de aço, gera problemas sociais crescentes, que estão ocasionando choques políticos cada dia mais violentos entre os comunistas de verdade e uma casta de corruptos, a máfia que pretende destruir a revolução e ser a nova burguesia chinesa. Para o lado que as coisas caminharem, a China não poderá continuar crescendo no rítmo atual. Se os capitalistas vencerem, a China passará a ter as taxas de crescimento decadentes de qualquer economia sob controle capitalista, e também crises de super-produção, e se os socialistas vencerem, as prioridades serão modificadas, haverá muito mais investimento em educação e saúde e a economia parecerá, de fora, não estar crescendo tanto quanto agora. No momento atual, os governo sob pressão social já estão tomando medidas visando reduzir o crescimento para conseguirem combater os problemas socio-econômicos, educacionais, higiênicos etc.

Fato é que a China anunciou que está reduzindo suas previsões de produção de aço, cujos preços continuam em queda. Significa que nos próximos anos talvez compre menos minério de ferro e menos de tudo. Como as exportações para a China são hoje um terço de tudo o que o Brasil exporta, nossa economia já está sentindo o impacto. Não será pequeno, mesmo porque outro terço de nossa exportação é para os EUA, que também não têm como escapar de uma crise grave, devido a sua dívida gigantesca. Se vamos passar por essa tempestade econômica com poucos ou muitos estragos depende do governo Dilma. Se ela se preparar para combater uma marolinha, será surpreendida por um tsunami. É muita sorte nossa que seja Dilma e não Lula pois o perfil dela é muito mais adequado que o dele, uma vez que o problema não será resolvido por brincadeiras, discursos e conchavos, maestria dele, mas somente com pulso firme. Em um país de bundões podemos afirmar com certeza que a presidenta Dilma pode vir a ser reconhecida como o ser mais macho que já governou o país desde a independência, só perdendo no momento para dois fascistas assassinos Getúlio Vargas e Arthur Bernardes, coincidentemente oriundos das duas matrizes estaduais da presidenta, regiões de forte sentimento nacionalista.

As medidas já tomadas são corretas. O governo está tentando estimular o consumo para compensar a queda de consumo externo. Mas a pergunta é se são suficientes. Mesmo com quedas nos preços e prestações infinitas, fato é que os brasileiros estão endividados e já não conseguem pagar suas dívidas. De fato, para que a crise faça poucos estragos, o governo teria que tomar mais controle da economia e fazer investimentos pesados, contudo, isso não é possível na economia brasileira de hoje sem gerar inflação e outros distúrbios, pois ao contrário da China, no Brasil é o mercado que se regula e que regula o governo. É um bom momento também para acelerar e aprofundar o Mercosul e a Unasul, tenhamos que ceder o que for necessário aos vizinhos.

Eis a sinuca de bico em que o tsunami econômico que está chegando colocará o governo do PT. Para agradar os capitalistas não poderá tomar medidas duras de controle do mercado, terá que deixar a crise fazer seus estragos e depois cortar benefícios da população, dos aposentados e pensionistas, dos funcionários públicos, e elevar impostos, ou seja, o que se exige da Grécia. Para agradar seus eleitores teria que usar de forte intervenção estatal, gerando a ruptura dos capitalistas com o governo. Como o povo é sempre muito mais tolerante (bobo) que os capitalistas, já sabemos qual será a opção petista. Contudo, estamos no Brasil, uma monarquia disfarçada de república, e quem manda é a presidenta, e como dissemos, enfim temos um macho na presidência. Ela não está fazendo a revolução socialista, nem democratizando o país, nem industrializando, nem educando, mas talvez se revolte com o sacrifício do povo. Ademais, ela acredita que pode segurar o leme do país e fazê-lo atravessar a crise inteiro, e na história podemos observar que por vezes quando um governante tem esse caráter ele acaba fazendo o que tem que ser feito mesmo que não fosse o seu plano original e muito menos o plano de seus aliados.

Logo descobriremos, pois não demorará e surgirão os problemas - Deixar tal e tal ex empresa estatal falir ou retomar seu controle ? Deixar milhares que pequenas empresas falirem ou fazer grandes encomendas para grandes obras públicas ? Permitir que os bancos públicos voltem a funcionar como bancos públicos e tenham prejuízos para salvar seus correntistas ou ferrar os correntistas? Se a presidenta optar por não permitir as falências, por não apertar o povo, terá que produzir dinheiro, portanto terá que retomar o controle do Banco Central e do câmbio. São exemplos ultra-simplificados (o que os torna distorcidos), mas fato é que ou se enfrenta a crise, ou se mantêm a política econômica liberal, são dois caminhos completamente opostos.

Comentários

Revistacidadesol disse…
Oi, Alex. Eu já penso que Dilma, afinal, é porta-voz do grupo de Lula. Esse grupo quer permanecer no poder o máximo de tempo possível e usará o realismo político cru. Provavelmente irão combinar algumas medidas de estímulo com o ajuste e o corte de gastos públicos (já começou, aliás, com cortes na cultura, segurança pública, dentre outros). Creio que o poder do PT será erodido aos poucos, com possibilidades de crescimento na extrema direita e extrema esquerda.

Realmente a China me deixa em dúvida: se caminhará para uma nova fase de construção do socialismo encerrando a atual "nep" ou aconterá uma contra-revolução pacífica. Tudo dependerá da dinâmica de classe. Há a administração e uma parte da burguesia que é mais antiimperialista e há uma parte conciliadora com o Ocidente. A queda de Bo Xilai me pareceu sinal que a parte conciliadora é mais forte.

O cenário que vc traçou é favorável à esquerda socialista, mas o que me preocupa é que mesmo o marxismo universitário é muito contra-revolucionário hoje em dia. Em geral, é inspirado no marxianismo do grupo de Fernando Henrique Cardoso. Um dos pilares do grupo é rejeitar radicalmente Vargas e qualquer debate sobre a questão nacional e colonial. Outro recurso mais recente, dos anos 80, é utilizar Gramsci para negar Lênin. Fora os que, por esse prisma, rejeitam praticamente toda experiência socialista e difamam o socialismo através Stálin e Pol Pot, como o Jacob Gorender, fornecendo à imprensa capitalista a mais baixa forma de anticomunismo. Isso é tão disseminado que até José Paulo Netto andou fazendo isso no livro O que é Stalinismo, da ed. Brasiliense. A meu ver, há uma longa marcha ainda a ser feita, estamos nos primeiros passos.

Abs do Lúcio Jr.

Abs do Lúcio Jr.