Tiririca e a reforma política

O fenômeno Tiririca desmoralizou a atual legislação eleitoral mais do que todas as críticas sérias feitas desde 1988. Ao se eleger e ainda levar consigo diversos deputados de poucos votos, gerou hilariedade (sincera) em massa, indignação (quase sempre hipócrita) e desconforto (político). Os risos foram sinceros de norte a sul do país, pois um palhaço que nunca fora realmente engraçado pela primeira vez nos fez rir, desde a campanha até entrar na Comissão de Educação da Câmara dos Deputados. A indignação foi hipócrita porque sempre se elegeram os tiriricas, e a diferença dessa vez foi somente que entre os candidatos que usam a estratégia de ganhar o voto de avacalhação, muito maior que o de protesto, um foi tão competente que se destacou a nível nacional. Ou seja, o que aconteceu de novo não foi Tiririca, foi que se tornou visível que se elegem os tiriricas. Em outras palavras, a indignação foi com a verdade! E o desconforto vem da mesma fonte, a verdade mostrando às massas que uma Câmara de Deputados cujo preenchimento de vagas tem uma falha dessas, uma grande porta pela qual entram os tiriricas, não é eficiente para nos governar.

Tiririca abriu a bolsa de Pandora! O sistema proporcional mal feito brasileiro está condenado, mas não há entre o povo nem sombra de um consenso sobre o que deve substituí-lo. Então, da direita a esquerda, surgem as propostas. O vice-presidente da República, Michel Temer, se apressou a defender a sua proposta e a do PMDB, segunda maior bancada e aliado indispensável do PT. A proposta peemedebista é o voto distrital puro e simples, já apelidado de "distritão", ou seja, o país seria dividido em distritos eleitorais, por exemplo, 53 em Minas elegendo cada um, um deputado. O PT fez a defesa do que seria de longe o mais politizado dos métodos possíveis nesse momento, que é o sistema proporcional de uma forma compreensível pelo povo, que podemos dizer que é o sistema proporcional de verdade, em que os eleitores votariam em partidos e coligações, e não em pessoas, a chamada "lista fechada" pela grande imprensa, que obviamente prefere o sistema distrital. O PSDB, por sua vez, pela voz de Aécio Neves, está propondo o meio termo, o sistema proporcional misto, no qual metade dos deputados seriam eleitos por distrito e metade por coligação de forma proporcional.

Como de costume, além de ter em mãos toda a imprensa, a direita brasileira está sabendo falar com as massas, pois embora o voto distrital vá de fato aumentar o poder dos capitalistas e do personalismo, ele é mais fácil de compreender - cada região elege seu deputado, que é o mais votado, e pronto. Temer usou isso muito bem, aproveitando a indignação do povo com a eleição de uns candidatos com os votos de outros, na medida em que esse povo não compreende o voto proporcional e portanto quando vota não pensa estar dando seu voto para uma coligação.

Mas como a decisão não será do povo, mas do Congresso, e o PT tem a maior bancada, resistirá ao voto distrital, tornando o PSDB o fiel da balança com sua proposta mista. Em poucos meses teremos um resultado para esse assunto, e é de fato o mais importante da reforma política, embora para o povo interesse muito mais o fim da obrigatoriedade do voto.

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