O REI ESTÁ NÚ

Sammer Siman

Economista e ex-conselheiro universitário da UFSJ



Quem manda na UFSJ são os conselhos superiores, sendo o conselho universitário a instância máxima de deliberação. O REItor só tem o rei no nome, pois é um mero executor das deliberações dos conselhos superiores. Logo, para dirigir a Universidade, é comum os reitores buscarem influenciar na composição de tais conselhos.

Desde 2004 o atual reitor da UFSJ acompanha todas as eleições de conselheiro que pode. Na sua ânsia de obter unanimidade ou ampla maioria do conselho, por algumas vezes fere a autonomia de entidades ou, no popular, “enfia os pés pelas mãos”, “enfia o pé na jaca”.

O caso mais emblemático ocorreu em 2010. Para compor uma vaga estudantil que estava aberta, o DCE elegeu o estudante de História André Luan Nunes Macedo. E o elegeu de acordo com o estatuto da UFSJ, alterado pelo CONSU em 2005 numa AMPLA DISCUSSÃO com a comunidade universitária.

Inconformado com a indicação feita pelo DCE o reitor iniciou a intervenção. Questionou a primeira eleição por meio da Procuradoria Jurídica. Diante do questionamento, o conselho achou por bem fazer nova eleição, elegendo novamente o estudante André Luan. Não obtendo êxito, o reitor iniciou investidas junto aos CA’s e DA’s (que são as entidades que elegem o conselheiro por meio do conselho de entidades de base), interferindo na autonomia das entidades. Um caso é simbólico:

Numa reunião com o CA de engenharia mecânica, o reitor condicionou um apoio financeiro à semana de engenharia ao voto da entidade em outro candidato a conselheiro que não fosse o estudante André Luan. Mostrando sua autonomia e coragem, mesmo diante da ameaça o CA de engenharia manteve seu voto no estudante André.

E com iniciativas desta natureza o reitor não obteve êxito. O estudante André Luan foi eleito e reeleito por CINCO vezes, ficando claro pra todo movimento a ingerência do reitor. Hoje tramita um processo na comissão de ética contra tal intervenção.

Na data de hoje, 24 de março de 2011, a reitoria propôs como pauta única da reunião do CONSU do dia 28 de março mudanças no estatuto da UFSJ, na tentativa de enfraquecer a autonomia do movimento estudantil. Sugere a alteração do artigo 10 do estatuto da Universidade, justamente o artigo que garante ao DCE a indicação dos conselheiros, querendo submeter a eleição do conselheiro ao voto difuso de cada estudante. Trata-se de um fato preocupantemente inédito nos últimos anos, propor importantes alterações estatutárias tão rapidamente, sem possibilidade de ampla discussão na comunidade universitária e, ainda, sem a participação de um dos dois representantes dos estudantes, que terá seu mandato vencido no dia 27 de março!

Além do que, tentando um gesto de esperteza, a reitoria sugere na alteração a expansão das vagas de estudantes no conselho, pra tentar confundir e dividir os estudantes. Algo ilegal, pois o Parágrafo Único do artigo 8º do Estatuto da UFSJ afirma que a composição do conselho deve ser de no mínimo 70% de professores, cabendo os outros 30% serem divididos entre técnicos e alunos.

Ou seja, pra cada aluno a mais, deverá haver um técnico a mais e sete professores a mais, algo impossível sem uma revisão geral do estatuto e do regimento da UFSJ!

Na sua ingerência, a reitoria levanta tal proposta em “nome da DEMOCRACIA”. Momento interessante pra debater tal tema, certamente uma boa hora pro DCE convidar alguém da reitoria pra debater o assunto. Democracia, palavra de origem grega, significa poder do povo. Ou seja, significa poder da maioria. No foco de análise, significa poder dos estudantes.

Ora, o que se propõe é dar a cada estudante um mísero voto. E nada mais. O conselheiro, por este tipo de eleição, seria eleito em eleições grandes, caras, de baixo nível, pois a reitoria obviamente se mostra como um pólo interessado, logo não mediria esforços para financiar a campanha de seus indicados. A “vantagem” deste tipo de eleição é que o representante não é controlado pelos “representados”, podendo votar do jeito que quiser, negociar seu voto do jeito que quiser.

Tal gesto nega a existência de uma representação estudantil, que, diga-se de passagem, já mostrou e tem mostrado sua força e organização, inclusive já ocupando a reitoria uma vez, uma ocupação declarada legítima por este mesmo reitor.

No entanto, é de se esperar que a atual reitoria seja atraída por esta pseudo-democracia. Em 2008, quando foram eleitos por este mesmo tipo de eleição de voto difuso, Helvécio-Valéria deixaram explícito em seu programa político a “defesa da autonomia dos departamentos”. Hoje, como os ventos mudaram na política universitária, eles falam de fim dos departamentos.

Este tipo de eleição funciona assim. Prometem mundos e fundos antes do voto e depois, com o passar do tempo, ignora-se promessas na mesma naturalidade em que se bebe um copo com água.

É interessante tratar de outro exemplo atual, guardada suas devidas proporções, é claro. A “democracia” norte-americana, sustentada nos mesmos pilares da atual defendida pela reitoria (do voto difuso), afirma dar opções ao povo.

Ora, Obama foi eleito encarnando a figura do “anti-guerra”, com a promessa de que retiraria rapidamente as tropas do Iraque e do Afeganistão. E o que aconteceu? Manteve as tropas, e agora lidera outra carnificina, outra invasão bélica.

O que dizer então? Teria o Obama alguma espécie de humor bipolar? O fato é que o fundamento do poder econômico norte-americano está na indústria de guerra e, independente do presidente, quem manda é tal indústria.

O poder que o DCE possui de indicar o conselheiro é amplo. O conselheiro é eleito e deposto a qualquer momento pelo conselho de entidades de base e deve estar sempre presente nas reuniões de DCE, discutindo com a base e prestando contas a ela. O dinheiro não faz sentido neste tipo de eleição, sendo eleitos os conselheiros mais competentes, mais estudados e que tenham maior compromisso com a base. Ao contrário das eleições individualistas, onde é eleito o mais bonitinho, o mais carismático, o mais rico, o mais subserviente, o mais cínico...

Enfim, mais um triste capítulo da UFSJ, que vê cada dia mais sua democracia ameaçada e atrofiada em nome de interesses obscuros.

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