Pernambuco: De volta às diferenças entre comunistas e anarquistas

É com tristeza que informamos nossos leitores que chegaram de Pernambuco informações que desmentem nosso anterior otimismo, que pode ser notado no texto publicado há alguns dias ai embaixo, do qual portanto temos que fazer uma autocrítica.

A informação é que os anarquistas não defendem o poder das entidades de base sobre o DCE, mas a dissolução de todas as entidades, DCE e entidades de base. Acontece que querem acabar não com as grandes eleições movidas a grana e sujeira (como são as de um DCE, com milhares de eleitores), mas com TODAS as eleições, mesmo as pequenas, onde a publicidade marqueteira tem pouca ou nenhuma influência, em que os eleitores sabem em quem estão votando e o uso de dinheiro não tem lugar.

Ora, isso somente criaria um período de bagunça, e propiciaria a volta da "democracia" capitalista mais forte ainda! Isso tem um nome, porque já não é novidade, mas foi feito várias vezes sem nenhum sucesso - é o assembleismo. Assembléia toda hora, para tudo, sem outra regra. É claro que funciona em períodos de auge do movimento, mas depois as Assembléias se esvaziam, e os poucos que sobram, nem sempre os melhores, passam a dirigir tão distantes das bases quanto os diretores "donos dos mandatos". As Assembléias são sim melhores que eleições diretas, mas é possível e necessário que existam ambas as coisas, mas ambas previstas em um estatuto, de forma a manter viva a organização também nos períodos de baixa do movimento.

Se interessa a alguém o que acontece a esse respeito hoje em São João del-Rei, informamos que há 6 anos o DCE é controlado pelas entidades de base, e que essa experiência gera constantemente nos militantes a percepção de que é necessário democratizar as entidades de base também. Mas isso não pode significar acabar com as eleições, tanto porque para um máximo de 400 alunos (que é o que têm os cursos) esses processos não são dominados pelo vil metal, nem por calúnias, mentiras, politicagem e manipulação marqueteira, quanto porque não existe como formar conselhos uma vez que as turmas nunca são fixas, quanto porque só com assembléias, como já explicamos, não existiria organização. É sim possível que as entidades de base substituam eleições diretas por assembléias para escolher e depor diretores, mas isso teria que ser feito em estatutos, não abolindo os estatutos! Começam a acontecer experiências diversas, em entidades de base da UFSJ, de reformas estatutárias tentando superar a democracia capitalista, que tendem na verdade a um poder realmente misto! Alguns eleitos em eleições diretas, outros em assembléias, outros representantes de turma. Também existem estatutos onde a revogação dos mandatos é possível.

Mas o que temos de concreto a apresentar, que está testado e já deu resultados positivos, é o poder das entidades de base. Se os anarquistas da UFPE defendem isso, não estão conseguindo o fazer com toda a eficiência pois optaram por uma explicação de acordo com suas ideologias - afirmam que não existe representatividade e são anti-partidários! Assim não explicam que na verdade o poder das entidades de base é muito mais representativo que qualquer eleição direta, mesmo pelo critério estreito dos capitalistas, que é o número de votos, pois muito mais estudantes votam nos seus Centros Acadêmicos que no DCE em qualquer universidade. Também as pesquisas indicam que os estudantes se sentem muito mais representados pelas entidades de base que pelos DCEs eleitos diretamente. Com o anti-partidarismo só conseguem colocar em dúvida o que defendem e afastar os membros de partidos, afinal que liberdade é essa, que democracia é essa em que todos os estudantes que têm partido são discriminados? Ora, uma coisa é ser contra os partidos dominarem DCE, Sindicatos e outras entidades, fazendo delas seus "aparelhos". Também somos contra isso. Outra coisa é ser contra a existencia dos partidos no Brasil, onde os partidos de esquerda são uns dos poucos espaços de participação política verdadeira. Lutou-se vinte anos contra uma ditadura, ao preço de milhares de vidas, para se ter a liberdade de organizar o Partido Comunista, e agora vamos ter novamente sua perseguição? Vamos assistir estudantes fazendo o trabalho da ditadura?

O que leva os anarquistas como diversos estudantes ao anti-partidarismo é a aparencia de que os partidos são os agentes, os vilões, os culpados dos "aparelhamentos" e consequentemente da crise do movimento. Não podem superar essa leitura superficial porque não têm acumulo de experiência partidária, ou seja, só vêm o problema por um dos lados. Quando o vemos pelos dois lados fica evidênte que na verdade os partidos e as entidades sociais são ambos vítimas, são ambos engolidos pela mesma engrenagem capitalista. Assim como candidatos a presidente da República, a governos de estados, prefeituras e aos parlamentos se comprometem com multinacionais, bancos e outros capitalistas para conseguir recursos para suas campanhas, estudantes que iniciam acriticamente a fazer movimento se comprometem com "seus" partidos, com reitores, com deputados, para conseguir rodar milhares de programas, panfletos, adesivos e cartazes. Assim como os políticos se corrompem ao satisfazer seus "apoiadores" financeiros e sanar as próprias dívidas, os estudantes destinam dinheiro de umas entidades para eleições de outras, para montar bancadas em congressos etc., dando prosseguimento à política de "seus" partidos ou chefes políticos.

Quem acha que isso é bom para os partidos não pensou direito. Como pode ser bom, sobretudo para comunistas, formar políticos capitalistas? Como pode ser bom treinar os millitantes em corrupção, golpes eleitorais, burocratismos etc.? Como pode ser bom atrair falsos comunistas que só se aproximaram com intenções eleitoreiras? Ora, de fato a degeneração de partidos inteiros só pode ser atribuída ao "aparelhismo". Lênin, tratando dos partidos que se degeneraram no início do século XX, culpou a participação no Estado burguês (sem deixar de ser a favor de participar), e seu diagnóstico não estava errado. Mas no Brasil degeneraram organizações com participação eleitoral irrisória! Ora, a degeneração dessas organizações foi fruto exatamente da atuação intensa e acrítica nas miniaturas de Estado burguês que têm sido os Sindicatos e DCEs. Organizações revolucionárias formaram "aparelhistas" pelos quais acabaram "aparelhadas"! Só existe uma maneira de não ser triturado por essa engrenagem capitalista, e é destruindo-a, o que só é possível substituindo-a por outra democracia, e não tentando substituí-la por nada!

Estamos, nota-se, de volta à velha polêmica entre anarquistas e comunistas, tão bem explicada por Lênin no Estado e a Revolução. Tanto os comunistas quanto os anarquistas sabem que o Estado capitalista é inimigo e deve ser substituído, mas os comunistas sabem que isso só é possível criando um novo Estado, do proletariado, enquanto os anarquistas defendem o fim dos Estados em geral. Claro que se trata de uma forma confusa de comunicação, pois na verdade sabemos que os verdadeiros anarquistas russos defenderam os Soviets e depois se incorporaram ao Partido Comunista, ou seja, na prática ajudaram a construir um Estado proletário. Assim também, na UFSJ, os anarquistas continuaram pregando suas utopias, mas na hora necessária souberam defender o poder das entidades de base (a única coisa que temos deles a reclamar por aqui é que continuam resmungando contra o Partido Comunista).

Apesar dessa confusão, em que existe a idéia do poder das entidades de base, mas embaralhado no meio de uma pregação anti-partidária e confusa, o simples surgimento em um estado da importância de Pernambuco do debate sobre a democracia já é interessante. Ao mesmo tempo, como se pode observar pelos sites do Partido em Santa Catarina, essa debate foi colocado em pauta na UFSC. No sul, a reflexão está mais clara, mais profunda, enquanto o fato em si é simplesmente um apelo a não se formar chapa para concorrer ao DCE, mas isso não de um ponto de vista esquerdista, e sim de perplexidade, em que se constata que é necessário refletir mais antes de agir. Foi desse documento de Santa Catarina que tiramos a palavra "engrenagem" que usamos várias vezes acima.

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